sábado, 20 de novembro de 2010

20 de novembro e O negro no Futebol Brasileiro

Para não deixar passar em branco esta data importante, em que a rua foi tomada de trios elétricos, nossa indiscutível marca, por dois motivos distintos mas tão semelhantes: Um trio no Campo Grande conduzia a marcha e a festa da CONSCIÊNCIA NEGRA. Do outro lado da cidade, três trios animam a inacabável festa do acesso do Bahia, mesmo com a derrota de hoje.

Coinscidência? Não. Tenha certeza que não.

O texto abaixo deve ser lido e considerado em seu contexto, obviamente. Já lá se foram mais de 40 anos e a situação, o discurso, o contexto, tudo isso mudou. O que não faz do texto e do livro sobre o qual comenta, um importante documento histórico sobre essa história que se completa: a do negro e a do futebol brasileiro.

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A VEZ DO PRETO - Édison Carneiro - 1964 (Texto das Orelhas da 2ª edição do livro de Mário Filho)

Esta crônica viva, movimentada, alegre, de êxitos e insucessos, avanços e recuos, marchas e contramarchas do negro na batalha que travou por um lugar no futebol metropolitano exemplifica a extrema versatilidade com que, historicamente, o nosso irmão de pele escura vem conquisntando, em todos os terrenos, a igualdade com todos os brasileiros.

A batalha particular do negro é quase toda a história do futebol - e, afortunadamente para nós, as suas várias peripércias são narradas ppor um homem tão senhor do assunto como Mário Filho, um velho sportman que conhece de primeira mão grande parte do que relembra, restaura e revive. E podemos dizer, com ele, que ao menos no futebol, chegou 'a vez do preto', tão bem simbolizada no triunfo mundial de Pelé.

Quando o futebol começou a candidatar-se à preferência popular, faltavam ao negro dinheiro e posição social. Naqueles tempos, as regatas e as corridas de cavalos eram as diversões prediletas. Esporte era para ricos, para brancos, ou pelo menos, para pessoas de boa família. O futebol não excluiu, inicialmente, o negro, mas não lhe deu as mesmas regalias que ao branco. O negro se conformava, parecia conhecer o 'seu' lugar, e o branco podia assumir a confortável atitude de bom senhor em relação aos escravos dóceis e obedientes.

O paternalismo desse primeiro período não durou muito. O interesse do público aumentava cada dia - o futebol não dava camisa a ninguém mas dava renome e fama - o remo e o turfe passavam a segundo plano - e houve um recrudescimento do preconceito de cor. No espírito do tempo, os ominosos tempos em que o fascismo estava em ascenção no mundo, a Amea, uma liga local, e a CBD se lançaram a campanhas de 'arianização' do futebol, afastando dos times jogadores pretos e mulatos, então numerosos - conta Mário Filho - nos clubes do subúrbio Bangu, Andaraí, América, Vasco, São Cristóvão. Tão deliberada era essa atitude dos racistas do futebol que nem mesmo se importavam co o risco da derrota em partidas internacionais. A ofensiva segregacionista fez as suas baixas nas hostes de cor - feridos, estropiado, desertores. Alguns tentaram disfarças a cor - Friedenreich engomava o cabelo, houve um mulato que cobria o rosto com uma camada tão espessa de pó-de-arroz que acabou dando o famoso apelido ao Fluminense. Outros, mais seguros de si, como Robson, declaravam já terem sido pretos. Outros se envergonhavam e se deixavam subjulgar, como Manteiga, que aproveitou a primeira oportunidade para voltar à sua terra, a Bahia, ou Leônidas que, vilipendiado, se refugiou em São Paulo. Outros ainda se asilaram em times estrangeiros. Em geral, porém, o negro não se deu por vencido - e, no campo e na pelada, com paciência e obstinação desenvolveu a perícia que, logo que os tempo mudaram, em especial após algumas derrotas memoráveis em campos estrangeiros, lhe abriu de novo as portas do clube. O negro não recebia um favor - não se confiava mais na vondade e na tolerância do branco, estava seguro das suas próprias forças e possibilidades, estava preparado para competir com quem quer que fosse em igualdade de condições.

Tudo isto está contado, com as minúcias naturais a quem conheceu de perto os acontecimentos que narra, neste livro de Mário Filho, em que estão vivos, estuantes de vida, no acerto e no erro, nas suas debilidades e nas suas virtudes, Friendereich, Manteiga, Leônidas, Domingos da Guia, o técnico Gentil Cardoso, Zizinho, Jair, Jaime de Almeida, Didi, Pelé e tantos outros, negros e mulatos de ontem e de hoje que deram o que podiam à glória e ao esplendor do futebol brasileiro.

Édison Carneiro - Historiador e escritor

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É bolada, meu Nego.

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