quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Seu Zé e a roseira flororô




"Seo Zé Tá tangendo em boi
E a porteira serrou
Quem foi nunca mais se foi
A roseira flororô
Seo Zé tá pensando em boi
Seo Zé tá pensando"
Monte, Brown e Reis


Há figuras com as quais a gente se encontra que representam uma pausa na vida. Uma pausa na loucura, uma pausa na necessidade. Espíritos de luz que cruzam nosso caminho e dilatam nossos minutos, nosso coração, nossa alma.

Pessoas assim nos levam a parar o tempo. É como se numa projeção a imagem avançasse aos poucos e tudo ficasse mais gostoso.

Há pessoas assim grandiosas, que cabem num pote pequeno, mirrado, surrado, suado. Um sorriso infinito que cabe numa boca quase sem dentes e que de dentro daquele universo negro te convida a ser mais gente.

Quantas vezes subia atrasada as escadas da escola de teatro, mas tinha que parar porque não conversar com Seu Zé sempre foi um sacrilégio. Não conheço um esse que tenha conseguido lhe ignorar ou lhe ser grosseiro. Pois ele é uma pessoa que se impõe pela doçura, pela leveza e pela simplicidade do existir.

Um crítico de teatro mais rigoroso que Bárbara Heliodora, ele assiste a tudo. E comenta depois. E diz que tava muito longa... Ele viu todas as nossas peças, todas as cerimônias de formatura (ele deveria estar no guiness book como a pessoa mais homenageda em colações de grau. Sempre cochilando, na hora da homenagem ele acordava ovacionado.)Até na minha defesa de mestrado ele tava lá.

Acho que ele é um anjo que deus mandou pra cuidar da gente. E um anjo criancinha que deus perguntou assim: "vc quer ir como?" e ele gaiato respondeu: "quero ir como um velhinho". E veio.

Como era o Seu Zé, antes de ser Seu Zé? Quem foi o menino Zezinho? Terá sido ele dono de uma porquinha preta? Terá ele usado calças curtas e blusa de tergal para ir à escola? Brincou de rolimã? de troca-troca? Como foi seu primeiro beijo? E como foi curado da primeira gripe? E o adolescente Zé? O que fazia o José para conquistar suas pretendentes? Será que era um pé de valsa? Será que fez serenata?

Ah, estrela mística esse Seu Zé, que parece já ter nascido Seu.

Eu tenho medo dessas coisas da vida. Eu tenho medo de câncer, eu tenho medo do escuro, eu tenho medo de hospital, eu tenho medo de solidão. Ah, destino oculto que ninguém sabe se é meu ou seu. Há duas noites penso na situação desse nosso anjo e meu coração fica pequeno demais. Queria que ele não sentisse dor. Que ele partisse como o passarinho que foi no jardim da escola de teatro, seu palácio. Mas a vida é real e de viés. E isso me choca.

Quando ele partir (Agora ou mais tarde. Todos nós vamos um dia.) precisamos de uma grande despedida. No palco do Martim Gonçalves, onde todos nós vamos poder aplaúdí-lo. Oh, grandiosa sabedoria do homem comum. Ai, que nessa hora somos todos iguais, matéria da natureza que um dia se transforma.

Obrigada Seu Zé. Meu Seu Zé. Nosso Seu Zé.

Dedico a você as bolinhas do meu rosário como faço para meus filhos. Envio toda energia e carinho que posso ter por alguém tão importante para mim e para todo aquele que um dia pode te conhecer.

NÓS TODOS TE AMAMOS, SEU ZÉ. E ESTAMOS FIRMES COM VOCÊ TORCENDO, LUTANDO POR SUA RECUPERAÇÃO.




quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

POR QUE OS ÍDOLOS NÃO SÃO PERFEITOS?


Que eu adoro Ronaldo Fenômeno todo mundo sabe.

Claro que eu nunca sonhei com o dia em que ele se declarasse a favor das minorias ou que fizesse algo publicamente impactante para as causas ideológicas da nossa sociedade. Também sei que ele tem todas as ferramentas para ser um machista homofóbico.

Gosto dele - ou gostava, tô resolvendo ainda - porque achava ele uma pessoa batalhadora, simples, e vou confessar, o sorriso dele lembra o sorriso da minha amada irmã mais nova. Gosto de seu futebol, de sua trajetória, de sua discrição e gosto também por simples e pura empatia. Ah, esqueci que gosto muito porque ele está no Corinthians, meu time B. E também porque ele joga muito e faz gols lindos e é um determinado. Adoro pessoas determinadas.

Mas, para nenhuma surpresa, ele se declara torcedor de Marcelo Dourado no BBB10. Meu mundo caiu. (exagero, tá gente!) Ele se declarou! Acho que este foi o golpe. Nada a admirar, mas ele falou! E isso acabou com minhas tolas adorações.

É claro que ele tem direito de gostar e torcer para quem ele quiser, mas isso nos coloca em lugares no mundo completamente opostos.

Poxa, Ronaldo. Se uma pessoa públcia tem direito de pensar e achar o que quer - como todos nós - ele deve ter, no mínimo, cuidado com o que diz, porque sua fala é amplificada. Sei que a maioria de seus admiradores o admiram ainda mais agora, mas eu pelo contrário, pego meu banquinho e saio de mansinho.

Vou continuar gostando do seu sorriso, mas sempre que lembrar de minha linda irmã mais nova, vou lembrar que lá em casa somos três irmãs, mães de lindas mulherzinhas pequenas, filhas de uma mulher maravilhosa, que é filha de outra e outra e outra, que poderiam ter sido vítimas de seu machismo, ter levado boas pancadas de homens que, como vc, não vêem gravidade alguma em publicar seus preconceitos e terrorismos anti-gay, anti-mulher anti-sabe-deus-mais-oque.

SALVE A DIVERSIDADE. LUTEMOS POR ELA! CHEGA DE DEIXAR ESTE POVO DECLARAR SUAS VIOLÊNCIAS E FICAR POR ISSO MESMO.
Dourado é a pior coisa que o BBB já expôs e é duro ver que boa parte do Brasil está com ele.

domingo, 21 de fevereiro de 2010

FIDELIDADE TEM LIMITE - Torcedor não é palhaço!


Alinhar à direita
"Ora, o pior resultado do mundo é o empate. O torcedor sente-se roubado no dinheiro da entrada e inclinado a chamar os 22 jogadores, o juiz e os bandeirinhas de vigaristas. Acrescente o seguinte: de todos os empates o mais exasperante é o 0 x 0, essa virgindade desagradável e irredutível do escore."
Nelson Rodrigues

Toda relação de fidelidade é baseada numa confiança que se alimenta ou senão definha.

Que o torcedor é um fiel (não só o corintiano) todo mundo sabe, mas daí a um time afundar de vez e jogar no lixo todo o respeito, dedicação e amor de uma torcida histórica, impressionante e esperar que o torcedor continue fiel, já é um pouco de mais. O Fiel corintiano foi junto pra segunda divisão, mas voltou no ano seguinte. Pra nosso desespero já se vão quase sete anos, sem falar na paradinha na terceira. Uma vida! Vai me dizer que o Bahia é isso? Bi-Campeão Nacional. Primeiro time brasileiro a jogar na Libertadores. Alôou!

Como fica, então? Alguém me responde?

O torcedor vai deixar de torcer para o Bahia? Não. Jamais. O que eu digo é que este Bahia mentiroso que tá aí tem que parar de sujar o nome do time mais tradicional e popular do nosso estado (eu sei que o Vitória é mais velho. Tradição não é sinônimo de idade.)

Quem é o time?

O elenco que, não sei se porque quer ou porque não consegue fazer melhor, só dá vexame no campo?

A equipe técnica que não consegue botar um time que presta pra jogar?

Uma diretoria descarada que não dá a menor bola pro torcedor que se acaba de coração e de bolso pra ver seu time fazer uma merda atras da outra?

Ou a torcida que jamais falha na sua tarefa de manter o time como uma instituição que ultrapassa tempos, escalações e gestões?

É a torcida, é claro.

De tudo o que passa o que fica é a torcida. Diretoria sai e entra, jogador mais ainda. Tá na cara de Edilson e Apodi que eles tão perguntando: "que diabo eu vim fazer aqui?" Pois meus dois queridos, essa é a pergunta que o torcedor faria se não tivesse certeza plena do que é: o verdadeiro dono do time.

Que não me venham prender por incitar a violência, mas bem que a torcida podia ir dar uns tapas nessa galera de novo no treino. É o que eu sinto vontade de fazer quando vejo uma lambança como o jogo de hoje ou o de quarta-feira passada.

E se a gente avançar na questão, o que é que querem fazer com A Bahia, não só O Bahia? Um futebolzinho descarado, risível que não vai pra lugar nenhum. Tirando o BAhia, sobra o quê? O Vitória, esse time de primeira divisão, mas não de primeira grandeza, completamente sem brilho, com um artilheiro que só faz gol de penâlti, e uma torcida que se pauta na comparação com o Bahia para poder ser feliz.

Vamos parar de palhaçada, de empresário ser o dono de tudo e fazer o que quer e o que não quer e o povo ficar chupando dedo sem fazer nada, só recebendo... só levando...

Já não me basta terem tirado o Chiclete do Campo Grande no domingo e anunciarem que ano que vem só vai ter na terça, porque na Barra tem mais conforto pro Bel, já não basta pobre pegar ônibus cheio e além de cansado, endividado, viver com medo. Medo no ponto, na rua, na porta de casa. Pobre com medo de pobre. Todo mundo rouba pobre. Rico rouba pobre, empresas roubam pobre, os bancos roubam o pobre, os políticos roubam dinheiro do povo. Não basta a dor da vida real e ainda me vem o Bahia e faz uns jogos desses. E ninguém diz nada. Caramba! Chega! O povo só é vítima.

ACORDA, gente. A gente não é minoria, não, a gente é maioria!!! No dia que a gente se retar de verdade vocês vão ver. Vão abusando do nosso limite de gado pra ver a merda que vai dar.

Por motivos muito parecidos fez-se a Revolução Francesa. Poucos com quase tudo e quase todo mundo sem nada. Chega uma hora que o lombo cansa. E aí vocês vão ver.

Diretoria do Bahia: acorda antes que a gente vai aí acordar vocês!

É bolada, torcedor!


Charge de Alam Félix


quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

ADEUS, SOFIA. A despedida de Doralinas e Marias


Há quem interessar possa, estou deixando o elenco do espetáculo Doralinas e Marias, da Diretora Cecília Raiffer, onde tive o prazer de contracenar com Meran Vargens, Luiz Renato, Daniele França e ainda trabalhar com o produtor Luciano Martins e suas luluzetes Michele e Jacy, Rino Carvalho e Angélica Paixão, Zuarte Jr, Beth Grebbler, Zélia Uchôa, Luciano Bahia, Marquinhos Fernandes, Alam Félix e o menino fofo do cartaz que eu num lembro o nome. Os motivos são os mais bobos e prosaicos do mundo. A vida segue, a barriga ronca, os filhos crescem e a conta vence no dia!

Foi muito bom.

Com Sofia descobri coisas de mim que nem desconfiava. Já me chamava atenção o Solo Compartilhada, onde falo tanto de solidão. Depois, faço esta personagem pesada, dura, entristecida e que estranhamente nasce de um processo de imersão em nós mesmas e que de repente sai aquilo, aquele caroço, aquela dor. Aquele nó de trança que me acompanhou durante mais de um ano e que fará parte de mim pra sempre.

Eu sofri e fui feliz com Sofia. Sofri porque ela me consumia. Porque eram dias cheios e eu ia ensaiar cansada pra cacete, em meio ao mestrado, às aulas na ufba aos bicos diversos. Sofri porque como ela, tenho pavio curto e paciência quase nenhuma. Brigava com todo mundo. Mas depois fazia as pazes. Choraaaaaaaaaaava que dava dó. Tava até chato já. Até desmaiar eu desmaiei. Depois do desmaio em plena cena, nunca mais fiz Sofia como antes. Fiquei com medo dela, medo de mim, medo do momento em que havia desmaiado. Sentia um calor insuportável debaixo de toda aquela roupa e de toda aquela luz.

Fui feliz porque estava fazendo teatro, por mais cansativo que fosse. Estava lá, enfrentando o leão (porra, sacanagem, leão é Vitória!) Porque tava criando algo pra dar pra alguém que fosse lá me ver. Não sei se o resultado foi o que eu esperava. Aliás, sei sim. Não foi. Foi outra coisa. Nem pior nem melhor. Foi outra coisa. No fundo é sempre outra coisa.

Como as três mulheres presas naquela casa por imposição do outro ou de si mesma, nós também tínhamos uns paus consideráveis (delicados, mas consideráveis) e obviamente cada um pensava de um jeito. Coisas de processo de criação coletiva ou colaborativa, o termo que melhor se adequar. Fui feliz por isso também. Por aprender a ceder e tentar ver com os olhos dos outros.

Mas Sofia será minha pra sempre. Pelo menos a minha Sofia será sempre minha. Outra atriz vai assumir - Cecília Raiffer vai fazer no Festival de Uberlândia porque eu não posso ir - e depois outra virá.

Em junho, eu, adriana, corto os cabelos, finda-se a promessa.

Liberto-me do passado. Salto uma página e outra e depois outra. Doralinas e Marias, já me vou-me. Silêncios e ossos duram milênios. Ofícios dos ossos. Dos amores entalados. Lìngua enrolada no céu da boca. Rabiscos nas margens dos dias. (Sônia Rangel By Cecília Raiffer)

As folhas do calendário vão continuar caindo sobre nossas cabeças. O tempo vai dexar ainda suas marcas em meu rosto, meu corpo, meus cabelos, minha alma. O vento vai trazer a chuva forte e eu não vou me esconder.


Adeus Doralina, adeus Alice, adeus Manoel. Adeus Sofia!

Sobre Doralinas e Marias:

http://bloglog.globo.com/blog/blog.do?act=loadSite&id=167&postId=17665&permalink=true

http://corpocariri.blogspot.com/2009/11/blog-post.html

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

BRASILEIROS E ARGENTINOS

Deixa eu avisar logo: este post não tem nada a ver com nada! Nada a ver com futebol, nada a ver com teatro, nada a ver com arte-educação, nem carnaval... O chato que pode se tornar um blog é vc ficar escravo do que parecia que vc deveria falar sobre. Aí as pessoas esperam e acabam lendo o que já esperavam e acaba ficando aquele chá de comadres.

Então, vou postar algo que tem merecido minhas horas de descanso e trabalho, porque paro o que tô fazendo para apreciar.

Eu simplesmente amo Astor Piazzola, e esta música é uma das grandes obras de arte da humanidade. Um alguém lá na Argentina fez este clip - eu adoro clip para youtube! - e eu nunca vi tamanho equlíbrio entre imagens e sons, todos fluindo para o que o título da música sugere: Años de Soledad. Deliciem-se.

P.P. (pós post) - A brincadeira do título é sacanagem pra chamar leitor. Não é que tem a ver?

sábado, 6 de fevereiro de 2010

A LEI PELÉ E A LEI PÉ NA BUNDA!


No futebol é antiga uma questão que intriga e provoca polêmica, protestos e manifestações. É a situação dos jogadores de futebol em relação a sua profissionalização e seus direitos trabalhistas, envolvendo, sobretudo a questão do passe do jogador. Escravidão ou passe livre?


A Lei Pelé (9615/98) tenta resolver de alguma forma este impasse, tornando o jogador dono do próprio passe, mas não avança em termos de direitos do trabalhador. Usado como um eficaz instrumento do jogo - como a bola ou a trave - o jogador é sugado ao máximo, enriquece diretores de clubes e empresários e quase sempre, acaba na miséria e no esquecimento.

Na arte-educação, não é diferente. Olha lá se não é pior. Explico já o aparente exagero.

Sem espaço nas instituições públicas, que rarissimamente abrem concursos para a área de artes - seja em nível de ensino básico ou superior - este profissional vive de pratinho na mão pedindo uma esmolinha numa ong aqui, uma ajudinha num projeto ali, uma vaguinha numa escolinha de bairro que não vai lhe assinar carteira. Nas escolas públicas, as aulas de arte são ministradas por professores de religião, português, filosofia e - pasmem - até de matemática. O critério? O professor que precisa de horas, pega as aulas de artes. Dá pra levar a sério um país desse? Alô LDB!

E as ogns, essas bem intencionadas instituições que querem salvar o mundo com arte-educação e cidadania. Pois bem. Começassem respeitando aqueles que estão na ponta, na sala de aula, no dia a dia! Como salvar criancinhas, adolescentes e jovens de um mundo brutal e cruel se este modelo de mundo é reproduzido dentro da própria instituição? Quero esclarecer que falo aqui das ongs que vem de "cima" e querem ajudar os coitadinhos de "baixo", movimentando um dinheiro considerável disponibilizado para salvar o mundo. Retiro deste saco, ongs nascidas das comunidades, geridas e coordenadas por ela, a exemplo da Casa do Sol Pe. Luiz Lintner e Beje-Eró, para citar apenas algumas. Mas, avancemos.

Diretos humanos são a cachaça da vez. Toda ong fala neles, cita seus artigos a torto e a direito, como dizem os mais velhos. E lá, na bendita declaração tá escrito:

Artigo 24: Todo o homem tem direito a repouso e lazer, inclusive a limitação razoável das horas de trabalho e a férias remuneradas periódicas.
Ongs e projetos especiais do governo (seja ele de que instância for) não assinam carteira, não garatem direitos, raras vezes oferecem benefícios e claramente infrigem a Consolidação das Leis Trabalhistas. Geralmente argumentam que o contrato de prestação de serviço não está ligado à CLT, mas no dia-a-dia o que somos é exatamente isso: trabalhadores.

Educador de ong é aquele que apela por um emprego, sujeitando-se às mais impensadas e humilhantes situações. Quando consegue uma vaga, é frequentemente lembrado que o "mercado" vai mal e que ele deveria muito era agradecer a oportunidade de estar ali. Quando o salário atrasa, é convidado a pensar como 'ong' e assim entender que as condições de trabalho são outras. É convidado a pagar de seu próprio bolso, transporte, alimentação e todos os juros das contas pagas em atraso, porque o recurso não saiu.

Fim de ano para educador de ong é um tormento. Sem estabilidade, sem 13º, sem férias, sem ao menos os salários de janeiro e fevereiro, este profissional tem verdadeiro pavor de virada de ano, pois já sabe que é tempo de vacas magras. Ao fim do projeto, em novembro ou dezembro, recebe um muito obrigado do gestor, a promessa de que talvez no ano que vem ele seja chamado novamente. Ah, mas lembre-se que para o projeto ser renovado, a gente vai precisar daquele relatório, com lindas fotos e um número de inscritos, não de concluintes... quem tá na prática sabe do que eu tô falando!

E lá se vai todo vínculo, levando com ele qualquer possibilidade de respeito, direitos e cidadania! E todos esses "temas transversais" tornam-se "temas proibidos". Das bizarras reuniões pedagógicas onde se distribuem textos sobre educação humanista à realidade dos fatos, as coisas mudam completamente de figura. Carteira assinada? FGTS? Seguro Desemprego? Licença maternidade? Plano de Saúde? Fala sério! Conquista de mais de 50 anos da classe trabalhadora, são ainda um sonho,uma proposta de futuro para arte-educadores... e jogadores de futebol!

Ok. O que fazer, então?

A democracia corintiana (movimento surgido na década de 80 no Corinthians, liderado por um grupo de futebolistas politizados: Sócrates , Wladimir, Casagrande e Zenon que constituiu o maior movimento ideológico da história do futebol brasileiro e foi um período da história do clube onde as decisões importantes, tais como contratações, regras da concentração, entre outros, eram decididas pelo voto, sendo assim uma forma de autogestão - EU AMO WIKIPEDIA!), trouxe ao futebol brasileiro uma possibilidade de algo improvável, mas que se tornou possível porque alguém ousou falar, refletir e propor mudanças. E olha que era época de ditadura militar. Desenhou-se no futebol um modelo sonhado para a vida real.

Considero que o movimento é forçar a barra dentro das instituições e projetos para que a nossa realidade pare de contradizer o nosso discurso dentro da sala de aula. Precisamos fazer de fato o que estamos ensinando na teoria. Paulo Freire já nos alertou que educação exige coerência. E se a gestão das ongs não está preocupada com isso, é preciso fazer com que se preocupe, senão por uma questão conceitual e ideológica, que seja porque isso virou para eles um problema. É preciso uma postura política. Sempre! As lutas e articulações políticas de classe tendem a ser esvaziadas e consideradas ineficazes, ultrapassadas e até ridículas. Mas isso é uma ação deliberada. Somos levados a crer que nada tem jeito, que nada adianta. É MENTIRA!

O que querem é que fiquemos parados, calados, isolados e intimidados. Assim, somos presas fáceis. Temos medo e vergonha de nos posicionarmos, de perguntar, de exigir direitos, informações.

Somos tratados como objetos dos projetos. Como a gaveta ou o grampeador, o arte-educador não faz parte das propostas nem das soluções. Pode até achar que faz, mas no fundo, não faz não. É preciso bater na mesa, chutar o balde, meter o pé na porta. Chega de sermos a "bucha de branco" do dominó do terceiro setor. Se vc está com problemas desse tipo e tem parceiros que querem lutar, fortaleça sua luta. Atue no coletivo. Não enfraqueça a luta de quem tem coragem de começar! A gente é maior do que imagina, me contou Augusto Boal. Seu colega de profissão é um aliado, não um concorrente. Ou a gente se enxerga como um todo e pára de lutar pela moedinha no fundo do prato, ou jamais seremos donos do nosso próprio passe. Jamais teremos mando de campo. Jamais seremos a bola da vez.

É bolada, arte-educador!